Desde a semana passada, o Conselho Regional de Enfermagem de São Paulo (Coren-SP) tem buscado orientar a categoria a se proteger contra o novo coronavírus (covid-19). Como outros profissionais da área de saúde, enfermeiros e técnicos de enfermagem se colocam em risco ao atender pacientes infectados. Contudo, segundo o Coren-SP, alguns deles têm se sentido desinformados e sido submetidos a agressões no caminho para o trabalho.
Para entender quais as principais dificuldades enfrentadas pela classe profissional com a pandemia do novo coronavírus, a Agência Brasil entrevistou a presidente do Coren-SP, Renata Pietro. A entidade representa 513.625 profissionais. Como uma mesma pessoa pode ter inscrição ativa em mais de uma categoria profissional contemplada pelo conselho, constam 567.859 registros, dos quais 224.838 são de técnicos, 204.621 de auxiliares, 137.897 de enfermeiros, 278 de obstetras e 225 de atendentes. A média de idade é de 40,9 anos e a maioria (86,4%) é mulher.
Apesar de o conselho ter lançado um chat para que os profissionais enviassem dúvidas sobre o assunto, Renata diz que muitos deles ainda se sentem confusos sobre as informações que chegam até eles, não sabendo discernir se são verdadeiras ou não, ou sobre como procurá-las. Ela destaca como principal problema a disseminação de fake news e acrescenta que mesmo pessoas que não são da área de enfermagem têm recorrido à entidade para fazer perguntas.
"Acredito que todas as instituições estão trabalhando para tentar fazer com que a informação chegue de maneira muito certa e correta para todos os profissionais. A Organização Mundial da Saúde tem preconizado, o Ministério da Saúde também. Eu acho que é importante seguirmos notícias oficiais. O que vem acontecendo é que tem muito fake [news] no meio do caminho e isso vai deixando as pessoas desesperadas. E, quando eu falo pessoas, falo da população, da comunidade de saúde. Então, precisamos ter algumas pontes importantes e informação muito séria para fazer com que efetivamente possamos dirimir as dúvidas", pondera.
Já no primeiro dia de funcionamento, na última quarta-feira (18), o volume de mensagens por chat foi tamanho que a plataforma travou. A presidente do Coren-SP conta que continua recebendo cerca de 150 questionamentos por dia, por e-mail e mídias sociais. Diante da chegada massiva de correspondências, Renata planeja selecionar as dúvidas mais comuns e divulgá-las no site do conselho, com suas respectivas respostas.
Para reduzir o nível de incerteza quanto às informações sobre coronavírus, o Coren-SP preparou uma programação especial do Coren Sem Fronteiras, programa ao vivo no Youtube. Participaram especialistas da enfermagem na área de infectologia e terapia intensiva, sob moderação da conselheira Érica Chagas.
Equipamento de proteção
Um dos direitos dos trabalhadores da área de saúde é dispor de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), que seus empregadores são obrigados a fornecer. Conforme explica o Coren-SP, a máscara hospitalar deve ter eficácia mínima na filtração de 95% de partículas de até 0,3 mícron e ser utilizada sempre que forem realizados procedimentos geradores de aerossóis, como intubação ou aspiração traqueal, ventilação não invasiva, ressuscitação cardiopulmonar, ventilação manual antes da intubação, indução de escarro, coletas de amostras nasotraqueais e broncoscopias.
A máscara cirúrgica, com respirador particulado, serve para conter a transmissão do vírus. A contaminação se dá quando há contato com gotículas respiratórias de um doente, inclusive quando este passa por procedimentos geradores de aerossóis. Por isso, ao se ter suspeita ou confirmação da doença, aconselha-se que a pessoa cubra a mão e o nariz para evitar que partículas pequenas de saliva ou secreções sejam espalhadas. Além disso, deve permanecer em isolamento domiciliar.
Ainda de acordo com o Protocolo de Tratamento do Novo Coronavírus, do Ministério da Saúde, os profissionais de saúde deverão ter à disposição gorros; óculos de proteção ou protetor facial, que podem ser reutilizados mediante a devida esterilização; e avental impermeável de mangas longas, que deve ser removido e descartado após a realização do procedimento e antes de sair do quarto do paciente ou da área de assistência; e luvas de procedimento, cuja troca deve ser feita durante o contato com o paciente, se puder haver contágio de uma parte do corpo para outra, ou quando estiver danificada. É proibido o reúso de luvas. Outro dever dos empregadores é garantir o acesso a um local onde os enfermeiros possam higienizar as mãos com álcool em gel frequentemente.
No último dia 13, o Ministério da Saúde divulgou comunicado em que estimava que o número de infectados poderia dobrar a cada três dias, caso as recomendações gerais de prevenção fossem ignoradas pela população. A projeção tinha como base o total de ocorrências confirmadas até aquele momento.
A presidente da entidade destaca, porém, que os hospitais e as unidades de saúde já lidam com a falta de insumos e materiais hospitalares necessários para o atendimento de pacientes com coronavírus. "O que tenho percebido é que tanto o Estado quanto [gestores] filantrópicos e privados têm buscado, sim, conseguir os recursos para os profissionais. Além disso, existe uma outra preocupação, porque, muitas vezes, os gestores estão com dificuldade de encontrar a disponibilização desses materiais. É muito importante lembrar essas questões, até por conta de uma limitação que a gente está vivendo por conta de todo esse movimento da covid-19."
O profissional que se sentir prejudicado pode formalizar denúncia junto à organização. Renata recomenda também que o protocolo se estenda ao Ministério Público do Trabalho, que emitiu nota sobre a importância dos EPIs, e aos órgãos de vigilância sanitária.
Violência
Segundo Renata Pietro, o conselho já recebeu diversas denúncias de enfermeiros que foram agredidos em veículos de transporte público, desde que a propagação do coronavírus se amplificou. "Nós estamos recebendo algumas denúncias de profissionais que estão de branco, que estão na rua, uniformizados. A população está agredindo essas pessoas, falando: 'Você está contaminado. Você vai me contaminar. Vai transmitir vírus'. O que a gente pede é calma e esclarecimento para todo mundo", relata. "É um cenário novo e, obviamente, é muito assustador para todos, mas precisamos enfrentar isso da melhor forma possível."
Uma das agressões ocorreu nesta quinta-feira (19), contra um grupo de quatro profissionais, na Linha Azul do Metrô de São Paulo. "Inclusive, estamos entrando em contato com o metrô, para tentar começar uma campanha. Foram agressões, e, muitas vezes, de não deixar o profissional entrar no vagão para poder trabalhar".
Questionada sobre a possibilidade de oficiar as autoridades públicas competentes, Renata responde afirmativamente: "O que a gente está fazendo é notificando a secretaria de segurança, de transporte, e tentando conversar com o metrô, porque precisamos começar uma campanha de orientação para a população."